Nas últimas quatro décadas, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra do Brasil assumiu o controle de milhões de hectares de terra, formando o maior movimento social da América Latina, escreve Vijay Prashad.
By Vijay Prashad
Tricontinental: Instituto de Pesquisa Social
INo frio inverno brasileiro de 2019, Renata Porto Bugni, vice-diretora do Tricontinental: Instituto de Pesquisas Sociais, André Cardoso, coordenador do nosso escritório no Brasil, e eu fomos ao Lula Livre ou Acampamento “Lula Livre” em Curitiba, montado do outro lado da rua da penitenciária onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava sentado em uma cela de 15 metros quadrados.
Lula estava preso há 500 dias. Centenas de pessoas se reuniam todos os dias no acampamento Lula Livre para lhe desejar bom dia, bom dia e boa noite – uma saudação que buscava ao mesmo tempo manter seu ânimo e oferecer um protesto animado contra seu encarceramento.
Oitenta dias depois, Lula saiu da prisão, sem de acusações que a maioria dos observadores condenaram, com razão, como absurdas. Ele agora é o principal candidato nas eleições presidenciais do país que ocorrerão no dia 2 de outubro.
Uma das características da vigília fora do presídio federal foi a onipresença de militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Suas bandeiras estavam por toda parte, seus quadros formavam a medula espinhal do movimento de libertação de Lula que floresceu de Curitiba para todos os cantos do país.
Formado em 1984 durante a ditadura militar (1964-85), o MST nasceu das ocupações de trabalhadores agrícolas e camponeses de latifúndios, propriedades gigantescas mantidas por indivíduos e empresas ricas. Nas últimas quatro décadas, esses agricultores assumiram o controle de milhões de hectares de terras em todo o Brasil, formando o maior movimento social da América Latina.
Aproximadamente 500,000 famílias vivem nestas ocupações lideradas pelo MST, o que significa que o MST organizou cerca de 2 milhões de pessoas nas suas fileiras.
Cerca de 100,000 mil famílias vivem em acampamentos (acampamentos), que são ocupações de pousios aos quais não tiveram acesso formal; 400,000 mil famílias vivem em assentamentos (assentamentos), cujas terras eles agora detêm por direito através de disposições liberais no Capítulo III do país de 1988 Constituição, artigo 184, que estabelece que o governo pode “desapropriar, por interesse social, para fins de reforma agrária, imóveis rurais que não desempenhem função social”.
Contudo, é importante notar que, pontualmente, o Estado brasileiro ainda tenta expulsar famílias desses acampamentos legais.
Os moradores dos assentamentos se organizam por meio de diversas estruturas democráticas, criam escolas para seus filhos e cozinhas comunitárias para os indigentes e desenvolvem técnicas de agricultura agroecológica para atendimento de suas próprias necessidades e para venda no mercado.
O MST está agora enraizado na paisagem social do Brasil; é impossível pensar no país sem a bandeira vermelha do movimento tremulando nesses acampamentos, desde a Amazônia, no norte, até o Arroio Chuí, o ponto mais meridional do Brasil.
Por trás da considerável atividade do MST existe uma teoria, e essa teoria – enraizada em conceitos como a reforma agrária – é detalhada em vários locais.
A vice-diretora do nosso instituto, Renata Porto Bugni, entrevistou um dos membros da coordenação nacional do MST, Neuri Rossetto, sobre sua compreensão da teoria do movimento e da relevância da escrita do comunista italiano Antonio Gramsci.
Publicada em conjunto com GramsciLab e Centro per la Riforma dello Stato, esta entrevista já está disponível em nosso dossiê nº. 54 (julho de 2022), “Gramsci em meio ao movimento dos trabalhadores sem terra no Brasil (MST).
Neuri, como prefere ser chamado, compartilha seu entendimento sobre Gramsci e reflete sobre os três principais desafios enfrentados pelo MST:
- identificar com precisão os adversários que impedem os esforços para enfrentar os dilemas da humanidade (como a reforma agrária);
- estabelecer um diálogo permanente com a classe trabalhadora para construir um projeto político para cada país; e
- fortalecer a capacidade política e organizacional das principais forças que fazem avançar as nossas lutas.
A hegemonia, como apontou Gramsci, emerge da prática de montar um novo projecto político a partir do “senso comum” do povo e de elaborar essas ideias numa filosofia coerente.
O conceito central para o MST elaborar esta teoria é a reforma agrária. Segundo Neuri, esse projeto de reforma luta “por um modelo agrícola centrado na produção de alimentos saudáveis para a população brasileira ao lado da luta pela democratização da propriedade da terra”.
O MST organiza os camponeses para melhorarem não só o seu controlo sobre a terra, mas também sobre a produção agrícola, inclusive evitando produtos químicos tóxicos que destroem tanto a terra como a saúde dos trabalhadores. Este projecto está agora ligado ao interesse dos consumidores por alimentos cujos componentes não os prejudiquem e cuja produção não destrua o planeta. A possibilidade de unir a maioria dos 212 milhões de habitantes do país em busca da reforma agrária galvaniza o MST.
O MST é um movimento social ou um partido político? Esta tem sido uma questão que tem atormentado o movimento desde a sua origem, há quase 40 anos. Na verdade, de uma perspectiva Gramsciana, a distinção entre estes dois – movimentos sociais e partidos políticos – não é tão significativa. O comentário de Neuri sobre esses temas na entrevista é bastante instrutivo:
“Temos consciência das responsabilidades e da necessidade de melhorar as nossas forças políticas, tanto no seu sentido organizativo como ideológico, para terem maior influência na luta de classes. No entanto, não pretendemos assumir o papel de partido político no seu sentido estrito, pois acreditamos que este instrumento político está fora do nosso âmbito. Isto não significa dizer que temos uma postura suprapartidária ou apartidária. Acreditamos que a articulação dos movimentos da classe trabalhadora, dos sindicatos e dos partidos políticos é fundamental na construção de uma outra sociabilidade alternativa e contrária à ordem burguesa. … [Não] subestimamos a importância e a força da ação política e das mobilizações populares como elemento educativo para as classes subalternas. As massas populares aprendem e educam-se nas mobilizações populares. É aí, no movimento de massas, que reside a força política da organização; é aqui que se eleva o nível político-ideológico das massas”.
Em suma, o MST faz parte de um processo de construção da força organizacional e ideológica do campesinato e trabalha ao lado dos movimentos sindicais e de outras organizações para criar um projecto político de emancipação social.
Para tanto, o MST participou da construção do Projeto Popular pelo Brasil (Projeto Brasil Popular), que, como diz Neuri, “visa consolidar um bloco histórico que promova lutas anticapitalistas e emancipatórias e ganhos económicos imediatos que atendam às necessidades e interesses da classe trabalhadora”. Promover a confiança e o poder da classe trabalhadora e do campesinato é, portanto, fundamental para a actividade do MST. Parte deste trabalho tem sido lutar contra a perseguição de Lula.
Em 1962-63, enquanto o Brasil era governado por uma formação de centro-esquerda liderada pelo presidente João Goulart, o clima no país era voltado para a mudança e as possibilidades.
Nesse período, o poeta amazônico Thiago de Mello (1926–2022) escreveu “Madrugada Camponesa”, que refletia sobre o árduo trabalho do campesinato para plantar não só alimentos, mas também esperança.
Quando o poema foi publicado em 1965 em um livro chamado Faz Escuro Mas eu Canto (Está escuro, mas eu canto), a situação política no Brasil mudou depois que um golpe liderado pelos EUA derrubou Goulart e levou os militares ao poder em 1964. O verso do poema “Está escuro, mas eu canto porque a manhã vai chegar” ganhou uma nova carga.
No próximo ano, Nara Leão cantou essas palavras e fez deles um hino da época. Deixamos a nossa newsletter desta semana com o poema de Mello, uma homenagem ao campesinato e à luta contra a ditadura do poder, do privilégio e da propriedade.
A terra ainda está escura
na madrugada camponesa,
mas é preciso plantar.
A noite era mais profunda,
agora a manhã está chegando.
Não há lugar para uma música
feito de medo e mimetismo
enganar a solidão.
Agora é hora da verdade,
cantado de forma simples e sempre.
Agora é hora de alegria,
que é construído dia a dia
com pão e música.
Em breve será (sinto isso no ar)
a época do trigo maduro.
Será hora de colher.
Milagres estão surgindo como
chuva azul nos campos de milho,
pés de feijão florescendo,
seiva fresca fluindo
das minhas seringueiras distantes.
Amanhecer da esperança,
a hora do amor está quase chegando.
Eu colho um sol ardente que queima no chão
e lavrar a luz de dentro da cana,
minha alma em sua flâmula.
Amanhecer camponês.
A terra é escura (mas não tanto),
é hora de trabalhar.
Está escuro mas eu canto
porque a manhã chegará
(Está escuro, mas eu canto).
Vijay Prashad é um historiador, editor e jornalista indiano. Ele é um escritor e correspondente-chefe da Globetrotter. Ele é editor de Livros LeftWord e o diretor de Tricontinental: Instituto de Pesquisa Social. Ele é um bolsista sênior não residente em Instituto Chongyang de Estudos Financeiros, Universidade Renmin da China. Ele escreveu mais de 20 livros, incluindo As nações mais escuras e As nações mais pobres. Seus últimos livros são A luta nos torna humanos: aprendendo com os movimentos pelo socialismo e, com Noam Chomsky, A Retirada: Iraque, Líbia, Afeganistão e a Fragilidade do Poder dos EUA.
Este artigo é de Tricontinental: Instituto de Pesquisas Sociais.
As opiniões expressas são exclusivamente do autor e podem ou não refletir as de Notícias do Consórcio.
Uma única cidade mencionada, uma cidade grande, e escreve sobre prisão. Não há outra cidade onde possamos verificar o assunto, acredita quem quiser!
Não entrar em pânico. É Orgânico!!! “Cooperativa Terra Livre”
na minha opinião, a vida comunitária “hippie”, eletrizada pelo poder de toda a comunidade de “Viver Bem!” “Uma cidade baseada na agricultura. Uma comunidade agrária. Promover a reforma agrária ou os interesses dos agricultores.”
De fato! Make it Rain, “Acreditamos que a articulação dos movimentos da classe trabalhadora, dos sindicatos e dos partidos políticos é fundamental na construção de uma outra sociabilidade alternativa e contrária à ordem burguesa”.
Continue crescendo. Cooperação, amor e vida, ou seja, “uma associação autónoma de pessoas unidas voluntariamente para satisfazer as suas necessidades e aspirações económicas, sociais e culturais comuns através de uma empresa de propriedade conjunta e controlada democraticamente”.
Basicamente, todo mundo funciona. Todo mundo é dono disso. Todos colhem os benefícios e os lucros!!!!
O objetivo: Sustento. Salve vidas. Salve o planeta; e, “O Motorista”, “A possibilidade de unir a maioria dos 212 MILHÕES de pessoas do país em busca da reforma agrária galvaniza o MST”.
Manter gerações de “hippies/camponeses/agricultores” amando a vida. Cultivar a terra; E, um dia “POSSUIR”, “Amanhecer camponês. A terra está escura (mas não tanto), é hora de trabalhar. Está escuro, mas eu canto. porque a manhã chegará (está escuro, mas eu canto).
Avante e para cima com “a luta contra a ditadura do poder, privilégio e propriedade”.